sexta-feira, 14 de dezembro de 2007

O nosso "jet met" quer ser como o "jet set" de lá: é bom saber!







“Há pessoas que só têm fachada. A entrada cheira
a palácio, e lá dentro a cabana.”
BALTASAR GRÁCIAN






E o país não se faz de supetão. O país vai se fazendo. Taco a taco. Pouco a pouco. O país faz-se fazendo-o, com pessoas agindo nas mais diversas áreas em que os homens encontram a satisfação das suas insaciáveis necessidades.
O país faz-se com todos, uns fazendo vapor e outros contravapor. O país faz-se com homens e mulheres, uns lentos, outros rápidos e aqueloutros ainda, super-rápidos.
Estes, os super-rápidos são os do jet set.
Quando surgiu em 1957, a expressão jet set servia para designar o grupo de pessoas ricas que se deslocavam de férias para importantes lugares turísticos do mundo, fazendo-se transportar em avião a jacto. Jet set é uma locução inglesa formada por jet, diminutivo de jet plane (avião a jacto) e set (grupo), isto é, “a turma do jacto”, “o grupo social dos aviões a jacto”.
Jet set era assim o grupo de pessoas que tinha poder aquisitivo para se deslocar nesse tipo de aviões super-rápidos. Aqui, quando vemos passar as cisternas da Sonangol que abastecem o aeroporto 4 de Fevereiro, com a inscrição jet fuel nos tanques, associámo-las por simpatia ao jet set. Combustível, fogo, poder, volatilidade, velocidade, o céu, as nuvens, o fumo, a imagem que se esfuma, quando o camião desaparece.
No fundo, riqueza, nobreza, moda, estilo, dinheiro, visibilidade social, aparência, são palavras que designam estatutos e atitudes agarradas como chiclets ao que ainda hoje se entende por jet set.
Os do jet set na América, na Europa, lá, em poucas palavras, constituem um círculo com acesso possível mas não fácil. Restrito. Um club com fronteiras confusamente delimitadas. Mas, uma elite! Uma roda de gajos que se sentem distintos dos demais pelas suas surpreendentes aparências comuns. Diferentes pelas suas inimagináveis afinidades, que os situam voando no mais alto patamar social.
Tal é a sua rapidez e a frágil velocidade da sua ascensão social, que é fácil distinguí-los no horizonte, inflamados balões cintilantes, sempre algo distantes da turba e da poeira sociais, diante dos holofotes, nos ecrãs dos televisores, nas capas das revistas cor-de-rosa, determinando o modo e a moda do momento no seu sítio.
O jet set é lá, então, a gente de quem se fala e de quem quase tudo se sabe, de bom e de não bom, verdades e mentiras. Como este sítio chamado mundo foi globalizado, o jet set de quem manda nesta aldeia global é o que está na montra. É o exemplo do templo, ao qual se rendem todos os súbditos que querem entrar no set, meter-se no club global, por via da sua afirmação local. É a pura “glocalização” do jet set.
É aqui onde a luva encaixa nos super-rápidos de cá. Só que os nossos mwangolês a caminho de serem set, ainda estão na fase do met. É assim que nasce e lentamente se compõe o nosso jet met.
E, então, met porquê?
Met, em inglês, é o passado de meet, que significa encontrar, defrontar, satisfazer, cumprir, conhecer alguém, reunir-se, juntar-se, etc. Tanto o met british como o met, de “mete” em português, sem o “e”, e com cara de inglês, do próprio verbo “meter”, preenchem as acepções características deste grupo aqui na banda. Para se ser do jet de cá é preciso primeiro se meter. Se encontrar, juntar-se, fazer esse tal grupo de iguais diferentes que vivem acima dos demais.
Para tal, urge entrar, introduzir-se, furar, penetrar, aparecer, ganhar visibilidade, expor-se, dar-se a conhecer, meter cunha, chamar a atenção, ser o centro de, brilhar, ser bom em algo que seja notado, ser bom também em meter-se e imitar bem para não destoar. É necessário praticar com traquejo um certo mimetismo para que na água do grupo o neófito se sinta um peixe.
No nosso jet met podemos encontrar gente com posse e algum mérito, que lhes reservaria um lugar próprio no jet set de lá, rodeada de outros que se sentam no met graças à sua camaleónica capacidade de transmutação, à sua invejável habilidade de adaptação ao meio. Estes últimos ases continuam a ser os premiados pela teoria evolucionista de Darwin.
O mwangolê do jet met anda na brasa em busca da sua afirmação social. Tem o pé no acelerador da sua projecção social. O olho em cada furo em que cairá o flash. A mão em busca da primeira oportunidade. O rosto eternamente rendido a abertura do diafragma da câmara. Os pés correndo atrás das passarelas. O coração na batida do dijei. E o corpo à mercê das ambições, sempre gigantes, da sua mente.
Podemos vê-los nas primeiras filas do Moda Luanda, nos badalados jantares da Fortaleza de São Miguel, nos aniversários das mais importantes casas nocturnas, nos shows de famosos artistas americanos, brasileiros, africanos e também angolanos, nas festas de carnaval organizadas por supostos metters, nalguns casamentos no Tropical, enfim, lá onde haja barulho, luz, som, imagem, fotografia e montra.
Contudo, os novatos do nosso jet met ainda ficam espantados, balbuciam mesmo ou soletram numa lenta aprendizagem, quando ouvem pelos corredores do jet set mundano palavras tais como: allure, beutiful people, BCBG, blasée, café society, dandy, demodé, fashion victim, glamour, gliteratti, habitué, hidden agenda, high-life, window shopping, lifestyle, look, name-dropper, nescafé society, novo-rico, opinion-maker, overdressed, paparazzi, patine, piroso, politesse, possidónio, RSFF, saison, snob, socialite, social climber, smoking, SSS, status symbol, trendy, vedeta, in e out, etc.
Estes, e outros mais, são vocábulos imprescindíveis para se ganhar estatuto de cidadania no paraíso do jet set. Conscientes disso, é fácil ver os mais empenhados abrindo amplamente os ouvidos, a mente e a curiosidade para captarem o perfeito sentido de cada um destes estrangeirismos, ao mesmo tempo em que topamos com alguns desajeitados precipitando-se a usá-los de ouvido e com sentido vergonhosamente equivocado.
Trata-se na verdade de um esforço titânico este, o de se vencer na vida através das aparências. O de se vencer encantando as almas que nos vêem. Caçando as brechas para se estar bem rodeado de glamour fátuo, registado num afã efémero de se parar por algum tempo o tempo, para desabrochar como pipoca no milho em que se encerra a imensa vaidade da nossa diminuta glória
E o jet met mete mesmo. Mete elegância e escândalo, mete medida enquanto desmesura, mete exagero atrapalhando o bom gosto, mete lucidez ofuscada pela ilusão, mete perfume confundido no suor, mete miséria escondida em lentejoulas, mete chapéus engalanando tolas ocas e o orgulho esfolado por verdes notas.
Eis a razão pela qual alguém bem sonhou em trazer para cá uma biblioteca do jet set de lá, já que o nosso met é inevitável e algum dia será mesmo set. Uma bibliotecazinha onde os nossos metters pudessem encontrar, para seu próprio cultivo e maior agrado dos que lá não estão, alguns livros de autores bem conceituados sobre a arte de se pertencer ao jet set mundial. Talvez assim a nossa montra tivesse mais belos exemplos de bem se expor, e a luz que os nossos astros irradiassem seria menos nociva aos olhos dos que lhes prestassem atenção.
A maior parte dos nossos jet metters ainda não sabe o que é o Bobo (Bourgeois bohemian), esta nova tendência pós-yuppies que abandonou o frenesin e workaholicismo e se apegou a novos códigos de conduta norteados pelo civismo, a moralidade, a ética, as boas maneiras e a ausência de snobismo. Com os Bobos o obscurantismo, o showoffismo e a futilidade foram varridos por uma verdadeira postura social das classes da alta sociedade, mais ajustada a ética, ao financeiramente correcto, ao respeito pelos demais que menos têm, ao altruísmo e ao anti-exibicionismo.
No fim da euforia o preço metido na longa factura dos metters acaba não sendo tão baixo quanto o estado em que se encontram os supostos beneficiários de tal estatuto social.
Mas lá está! Na vida se diz que cada um tem o seu preço. Não nos parece cómodo exigirmos de alguém um preço superior ao que ele mesmo se dá. Até poderíamos ser mal entendidos e maltratados, apesar da nossa evidente boa fé.
Vivamos então segundo o preço que nos damos. Haverá sempre quem queira dar mais por nós. Haverá certamente alguém a quem negar, por menos nos oferecer. E haverá, dúvidas que se esfumem desde já, uma porta no set pela qual todos os nossos jet metters tenham a oportunidade de entrar algum dia para ocuparem o seu muito sofridamente sonhado lugar no jet.
E assim se fará o nosso jet set. Ainda bem que é possível sonhar!







Roderick Nehone

23/02/2007

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